terça-feira, 17 de março de 2009

Conservadores ou radicais?


A Segunda polarização desnecessária na igreja contemporânea refere-se a “conservadores” e “radicais”. Devemos começar pela definição dos termos. Por “conservador” estamo-nos referindo às pessoas que estão determinadas a conservar ou preservar o passado e são, por isso, resistentes a mudanças. Por “radical” referimo-nos às pessoas que estão em rebelião contra o que é herdado do passado e estão, por isso, fazendo agitações por mudanças.
Deixai-me, agora, definir mais precisamente em que sentido cada crente deveria ser um conservador e um radical, ao mesmo tempo: Cada crente deveria ser conservador porque toda a Igreja é chamada por Deus para conservar sua revelação, para “guardar o depósito” (I Tm. 6:20; II Tm 1:14), para “batalhar pela fé que uma vez foi dada aos santos”, Jd 3. A tarefa da Igreja não é continuar inventando novos evangelhos, novas teologias, novas moralidades e novos cristianismos, mas, antes, ser uma guardiã fiel do único Evangelho eterno, pois a auto-revelação de Deus alcançou sua consumação no seu Filho Jesus Cristo e no testemunho apostólico de Cristo, preservado no Novo Testamento. Isto não pode ser alterado de forma alguma: É imutável em verdade e autoridade.(...)

Alguns crentes, contudo, não limitam o conservantismo deles à teologia bíblica que professam. O fato é que são conservadores por natureza. Eles são conservadores na política e na perspectiva social, no estilo de vida, no estilo de vestir, no estilo de cortar o cabelo, no estilo da barba, em qualquer outro tipo de estilo que se mencione.

Não estão apenas atolados na lama, a lama deles endureceu como concreto. Mudança de qualquer tipo é anátema para eles.(...)

Um “radical”, por outro lado, é alguém que faz perguntas grosseiras sobre as tradições estabelecidas. Ele não considera qualquer tradição, qualquer convenção e qualquer instituição (ainda que antiga) como sendo sacrossanta. Ele não reverencia “vaca sagrada” alguma. Pelo contrário, está preparado para submeter qualquer coisa herdada do passado ao escrutínio crítico. E seu escrutínio geralmente leva-o a querer reformas, até mesmo revolução.

Um radical reconhece a rapidez com que a cena do mundo está mudando hoje. (...) Sabendo que mudanças são inevitáveis, ele dá-lhes as boas-vindas e se ajusta para a chegada de qualquer mudança. E até mesmo a inicia.

Parece então à primeira vista, que conservadores e radicais estão em oposição e que não podemos fazer outra coisa senão polarizar nesta questão. Mas não é bem assim. Não é bem entendido que nosso Senhor Jesus Cristo foi conciliatoriamente um conservador e um radical, embora em esferas diferentes. Não existe a menor dúvida de que ele foi um conservador em sua atitude para com as Escrituras. As Escrituras não podem ser anuladas, “nem um jota ou um til se omitirá da lei, sem que tudo seja cumprido”, (Jo. 10:17; Mt. 5:17,18). Uma das principais queixas de Jesus contra os líderes judeus da sua época referia-se ao desrespeito por parte deles pelas Escrituras do Velho Testamento e à falta de uma verdadeira submissão à sua autoridade divina.
Mas Jesus pode também ser verdadeiramente descrito como um radical. Ele foi um crítico mordaz e destemido do tradicionalismo judeu, não somente devido à insuficiente lealdade que havia para com a Palavra de Deus, mas, também, devido à lealdade exagerada às próprias tradições humanas. Jesus teve a temeridade de lançar fora séculos de tradições que tinham sido herdadas, “as tradições dos anciãos”, para que a Palavra de Deus pudesse ser apreciada e novamente obedecida. (Mc. 7:1-13). Ele foi, também, muito ousado nas violações das convenções sociais. Insistiu em preocupar-se com todas as áreas da comunidade que eram normalmente menosprezadas: falou com mulheres em público, o que não era aceito nos seus dias, convidou crianças para que viessem a Ele, embora na sociedade romana crianças rejeitadas fossem geralmente “abandonadas” ou deixadas ao relento, o que levou os discípulos a acharem que ele não gostaria de ser incomodado por elas. Ele permitiu que prostitutas o tocassem (os fariseus afastavam-se delas horrorizados) e Ele mesmo, na realidade, tocou num leproso intocável (os fariseus apedrejavam-nos para que fossem mantidos à distância). Destas e de outras maneiras, Jesus recusou-se a ser preso por costumes humanos: sua mente e consciência estavam presas unicamente à Palavra de Deus. Por conseguinte, Jesus foi uma combinação única do conservador e do radical.
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Cristianismo equilibrado
John Stott

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